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17/03/2011
Debate emperra novo Código Florestal
Uma queda de braço entre ruralistas e ambientalistas vem marcando o debate em torno do novo Código Florestal brasileiro. A matéria está em análise no Congresso Nacional e, por parte dos produtores rurais, existe pressão para que seja votada até o fim do mês ou, no mais tardar, nos primeiros dias de abril. O atual código está em vigor desde 1965 e há anos existem tentativas de atualizá-lo. Em outubro de 1999, o deputado federal Sérgio Carvalho (PSDB-RO) apresentou o projeto de lei 1.876 propondo a reforma. Depois de três anos, a proposta foi arquivada e, em maio de 2003, o parlamentar acabou falecendo. Em dezembro de 2009, o governo federal publicou decreto instituindo o Programa Mais Ambiente, que objetiva recuperar, recompor e manter as áreas de preservação permanente (APPs) nas propriedades, além de obrigar os proprietários a averbarem a área de Reserva Legal (RL) do imóvel. Como o decreto estipula a data de 11 de junho de 2011 para a adesão ao programa, surgiu a necessidade de agilizar o debate em torno da reforma do código. A Câmara criou a Comissão Especial do Código Florestal e, em julho de 2010, o relator, deputado Aldo Rebelo (PC do B), publicou o substitutivo aprovado pelo grupo. Ele contempla, em parte, os anseios dos ruralistas, mas desagrada em muito os ambientalistas, o que tem provocado polêmicas. O próprio governo federal não concorda com alguns pontos e não afasta a possibilidade de encaminhar uma proposta alternativa. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT), que havia se comprometido a colocar a matéria em votação no mês de março, preocupado com as divergências e sentindo a possibilidade de o assunto não evoluir, criou um grupo para, informalmente, tentar compatibilizar os interesses dos dois segmentos. Na semana passada, ele concedeu entrevista admitindo que a votação ainda pode levar dois ou três meses. PRESSÃO O deputado federal Luiz Carlos Heinze (PP), em visita a Santa Cruz do Sul, apelou às entidades que defendem os produtores, bem como aos vereadores e prefeitos nos municípios gaúchos, para que pressionem a favor da votação da matéria o quanto antes. Segundo ele, se isso não ocorrer, a partir de 12 de junho milhares de pequenas propriedades rurais estarão na ilegalidade, pois não conseguirão atender às exigências do Programa Mais Ambiente. Isso, inclusive, vai inviabilizar o acesso ao crédito rural. A mesma posição é manifestada pelo deputado Heitor Schuch, do PSB de Santa Cruz. “Temos que definir logo estas questões do código.” Segundo ele, o relatório de Rebelo pode não ser o ideal, mas oferece um tratamento especial aos pequenos produtores. “O substitutivo não é para os especuladores, mas sim para quem produz.” Projeto tem sido alvo de críticas A reforma do Código Florestal é um assunto polêmico e tem despertado o interesse dos produtores rurais, dos ambientalistas, do governo e até de organizações internacionais de defesa do ambiente. O substitutivo apresentado por Rebelo tem 270 páginas e não tem escapado das críticas. O deputado defende o texto e diz que a comissão contou com o assessoramento de entidades técnicas, como a Embrapa. As áreas de preservação permanente (APPs) são o foco principal das divergências. Para os ambientalistas, o projeto é um retrocesso, pois permite o avanço sobre espaços que deveriam ser preservados, como é o topo dos morros, as várzeas, as margens de rios e outras. PRESERVAÇÃO PERMANENTE As APPs são áreas de grande importância ecológica, cobertas ou não por vegetação nativa, que têm como função preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. Por isso, os ambientalistas são intransigentes na defesa dessas áreas. Os ruralistas, no entanto, entendem que boa parte desses locais é mal aproveitada e defendem um melhor uso. Como exemplo, citam a região do Pantanal. No debate que envolve as APPs existe uma proposta simpática às duas alas: o pagamento por serviços ambientais a quem mantiver as áreas verdes preservadas. Mas em todas as hipóteses em discussão, os pequenos proprietários terão que seguir as regras que tratam das APPs. Eles também não poderão abrir novas áreas de plantio ou de criação nesses espaços. ANISTIA A DESMATADORES O projeto perdoa dívidas por desmatamentos ilegais realizados até meados de 2008. A proposta não possui o apoio do governo federal e nem dos ambientalistas. A União tem um passivo de mais de R$ 10 bilhões em multas para propriedades rurais. Se a anistia for aprovada, além de não haver necessidade de recuperar as áreas desmatadas, os infratores não vão ter que arcar com as consequências dos crimes que cometeram, o que é considerado como um incentivo ao desmatamento. Existe possibilidade de negociação nesse artigo. A anistia seria concedida até 2001, quando foi editada a medida provisória que alterou a área de proteção permanente (APP). Quem desmatou até essa data, teria tratamento diferenciado dos demais. Assim, as áreas consolidadas seriam garantidas e a lei não retroagiria para punir. Já as multas poderiam ser convertidas em compensação ambiental. MARGEM DOS RIOS O texto de Rebelo reduz de 30 para 15 metros a faixa de preservação (mata ciliar) dos cursos-d’água (arroios e rios) com até cinco metros de largura. Nos demais, a metragem é variável e pode ser de até 500 metros nos rios de grande porte. Conforme os ambientalistas, com a redução os riachos ficarão mais expostos à erosão, ao assoreamento e à poluição das residências e das ruas. Com isso, irão agravar a poluição nos rios maiores. O relator afirma que a medida objetiva beneficiar as pequenas propriedades. Existem algumas que são cortadas por dois ou três arroios e, se o proprietário tiver que preservar 30 metros de cada lado, praticamente não terá onde plantar. RESERVA LEGAL Outra polêmica reside na chamada área de reserva legal (ARL). Trata-se de uma gleba de 20% da propriedade que deve ser destinada à preservação ambiental, com mata nativa. A proposta retira essa exigência das propriedades que têm até quadro módulos fiscais. Na região do Vale do Rio Pardo, por exemplo, 90% das propriedades não precisariam mantê-la. Situação idêntica ocorreria em outras regiões do Brasil e, por isso, os ambientalistas não aceitam esse artigo. Entendem que a proposta será um incentivo ao fracionamento de médias propriedades, como forma de escapar da exigência. Uma alternativa em discussão é a dispensa da ARL apenas em propriedades de agricultores familiares, com até um módulo fiscal (cerca de 16 hectares em nossa região). No entanto, teriam que preservar as matas nativas que possuem, como já determina o atual Código Florestal. Outro ponto polêmico é a possibilidade de as áreas de preservação permanente serem computadas na ARL, como propõe o substitutivo de Rebelo. A medida abriria mais espaço para a produção nas propriedades, especialmente as pequenas. Os ambientalistas defendem que as APPs e as ARLs são coisa diferentes e que uma não substitui a outra. Também não aceitam que, na Amazônia, a ARL seja reduzida de 80% para 50%. ENCOSTAS A proposta também trata da utilização das APPs localizadas em encostas de morros com mais de 45º de declividade. Ela mantém as atuais regras de preservação, mas consolida as áreas que já são usadas para atividades agrícolas como no plantio de uva no Rio Grande do Sul. Essas serão objeto do Zoneamento Ecológico-Econômico, a ser promovido na esfera de cada Estado. O uso dos topos de morros, montanhas e serras, no entanto, tem a contrariedade dos ambientalistas. O próprio Ministério do Meio Ambiente não concorda com a iniciativa. Os topos são áreas importantes para os lençóis freáticos, pois quando chove é lá que a água entra no solo e abastece os rios subterrâneos. Além disso, a vegetação dos topos evita os deslizamentos.fonte: Gazeta